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Saturday, February 12, 2011

Passagens favoritas dos textos de Contardo Calligaris

 1)  A paixão pelo novo e o casamento

Achamos mil culpados pela mesmice que nos assola. Mas logo a lista dos acusados chega a parceiros e parceiras -como se fossem bolas amarradas no pé, correntes que nos travam. O cônjuge torna-se a encarnação dos motivos pelos quais desistimos do novo e da aventura. Ele é responsável por nosso tédio, culpado de toda estagnação. Ele carrega, aos nossos olhos, os estigmas da mesmice: imaginamos dever-lhe tudo o que parece nos prender -um domicílio, a responsabilidade de sermos pais, mais uma família que se acrescenta ao peso da nossa família de origem etc.

2)       Peixe Grande e a paixão pela vida
Ora, sou pai de três rapazes. Gostaria de lhes transmitir uma paixão pela vida que não dependesse da realização de sonho algum, ainda menos de um sonho meu. Gostaria que eles encontrassem sua razão de viver não alhures (numa obrigação ou mesmo nos grandes princípios que dirigem suas ações), mas na própria experiência da vida que levam, em seus momentos felizes ou tristes, jocosos ou duros.
[...] Durante 50 anos, meu pai manteve um diário. Sob pretexto de que sua caligrafia era ilegível, ele ditava o texto para minha mãe. Às vezes, eu ficava escutando atrás da porta. Odiava (e me fascinava) a transformação que as palavras do diário impunham a acontecimentos que eu tinha presenciado e que foram, a meu ver, insignificantes. Na descrição do meu pai, a banalidade do cotidiano se tornava uma vasta produção teatral cujo tema maior era sempre, aliás, o seu amor pela minha mãe.
De fato, o cônjuge é acusado injustamente: geralmente ele é apenas o porta-voz do medo que acompanha e modera nossa paixão pelo novo. Somos filhos de uma cultura que, ao mesmo tempo, promove o pequeno núcleo familiar fundado no amor e idealiza a liberdade de quem não pára de se reinventar sozinho. Queremos aventura, mas receamos esse nosso desejo e procuramos portos seguros. Culpar o cônjuge é uma maneira de evitar a contradição.
Respeitando esse dilema, a literatura de ajuda, descrição e análise do casamento segue duas tendências. Há os aventureiros, que encorajam homens e mulheres a -expressão consagrada- "realizarem seu potencial" perseguindo novos horizontes. E há os casamenteiros, partidários de compromissos e negociações que permitiriam atravessar a vida de mão dada.
[...] Se os esforços para manter ou reinventar o casamento nos parecessem tão emocionantes quanto a procura e o risco da novidade, o casamento encontraria um fôlego extraordinário, pois conciliaria a paixão pelo novo com a nostalgia de um porto seguro.

3)   Vicky Cristina Barcelona

Os casais que se amam de paixão, cujos parceiros parecem ser feitos um para o outro, em regra, acabam tentando se matar -com faca, revólver ou qualquer outro instrumento (cf. Juan Antonio e Maria Emilia). É porque, se o outro me completa e vice-versa, o risco é que nenhum de nós sobreviva à nossa união -ao menos, não como ente separado e distinto. Mas, por mais que seja ameaçadora, a paixão amorosa é uma tentação irresistível (cf. Cristina, Vicky, Judy) por uma razão simples: nas narrativas de nossa cultura, ela é o protótipo ideal da experiência plena, da vida intensamente vivida.

Por sorte ou não, o amor-paixão é raro. A maioria de nós vive relações menos "interessantes" e menos fatais -relações em que a gente se preocupa em criar os filhos, decorar a casa, ganhar um dinheiro ou jogar golfe (cf. Vicky e Doug, Judy e Mark). Não seria tão mal, salvo pelo detalhe seguinte: em geral, nesses casais "normais", ao menos um dos parceiros vive com a sensação de que sua escolha amorosa é resignada, fruto de um comodismo medroso: "O outro não é bem o que eu queria; culpa minha, que não tive a coragem de me arriscar a amar..."

[...] Os que parecem não idealizar o amor-paixão passam o tempo se protegendo contra ele. Deve ser por isto que a "normalidade" amorosa pode ser insuportavelmente chata: porque ela exige a construção esforçada de defesas contra a paixão -argumentos morais e sociais, sempre mais "razoáveis" do que racionais (cf. Mark, Doug).

[...] A paixão não é uma coisa que a gente possa encontrar saindo pelo mundo como um turista da vida (cf. Cristina). Pois não basta esbarrar na paixão; ainda é preciso encará-la quando ela se apresenta.

[...] "É um filme triste porque os personagens se apaixonam, vivem sentimentos fortes, mas, no fim, tudo isso não transforma ninguém. Vicky e Cristina vão embora iguais ao que elas eram no começo, sobretudo Cristina...".

Minha amiga tinha razão. O amor e a paixão não nos fazem necessariamente felizes, mas são uma festa e uma alegria porque deles podemos esperar ao menos isto: que eles nos tornem um pouco outros, que eles nos mudem.
Agora, nem sempre funciona...

4)       A coragem do amor que dura


É inegável: nossa cultura idealiza a ruptura, a aventura, a saída para o mar aberto. Em matéria amorosa, o momento que preferimos contar é a hora do apaixonamento. Depois disso, gostamos de imaginar que "eles viveram felizes para sempre", mas sem entrar em detalhes que poderiam transformar a história numa farsa.

Uma boa solução, aliás, é que os amantes morram logo. O sumiço (de ambos ou de um dos dois) evita que a comédia da vida que levariam juntos contamine a apoteose do encontro inicial. Os amantes ideais são os que não duraram no tempo: Romeu e Julieta, o jovem Werther e Charlotte, Tristão e Isolda.
Concluir o quê? Que a coragem é sempre a de quem deixa a mornidão de seu conforto para se queimar num instante de paixão? Será que não pode haver coragem nos esforços para que o amor dure?
Geralmente, explica Badiou, minha experiência do mundo é organizada por minha vontade de sobreviver e por meu interesse particular: vejo o mundo só de minha janela.

Certo, ao redor de mim, há muitos outros de quem gosto e aos quais reconheço o direito de também sobreviver e promover seus interesses. Mas o fato de eu respeitar esses meus semelhantes não muda em nada meu ângulo de visão. É só quando amo que consigo olhar, ao mesmo tempo, por duas janelas que não se confundem, a minha e a de meu amado. A estranha experiência ótica faz com que os amantes reconstruam o mundo, enxergando coisas que ficam escondidas para quem só sabe olhar por uma janela.
Entende-se que o amor assim definido exija tempo. Quanto tempo? Um mês, um ano, uma vida, tanto faz. Consumir-se na paixão pode ser rápido, mas reinventar o mundo a dois é uma tarefa de fôlego.

O amor segundo Badiou, em suma, é uma aventura, mas que precisa ser obstinada: "Abandonar a empreitada ao primeiro obstáculo, à primeira divergência séria ou aos primeiros problemas é uma desfiguração do amor. Um amor verdadeiro é o que triunfa duravelmente, às vezes duramente, dos obstáculos que o espaço, o mundo e o tempo lhe propõem".
 

5)       Closer - Perto demais: por que somos infelizes no amor?

Os evolucionistas dizem que os homens são infiéis por necessidade biológica. Para que a espécie continue, os machos seriam programados com o desejo de fecundar todas as fêmeas possíveis. A teoria tem uma falha: as mulheres são tão infiéis quanto os homens (embora os homens se recusem a acreditar nessa banalidade).

O senso comum tem outra explicação: a paixão iria se apagando com a repetição, os humanos gostariam de novidade. Pequeno problema: a idéia de que a novidade seja um valor é especificamente moderna; no entanto a inconstância em amor é um hábito antigo. Outro problema ainda maior: na condução de nossas vidas, somos obstinadamente repetitivos.

[...] Como pode ser que um encontro, em que mal se sabe quem é o outro ou a outra, contenha uma promessa que basta para levar alguém a dar um chute num amor que dura?

Tento responder: apaixonar-se é idealizar o outro, durar no amor é lidar com a realidade do amado ou da amada. Antes de ponderar os charmes da idealização, duas observações.

Um impasse: para manter a paixão, devo continuar idealizando o parceiro. Mas, para idealizar o outro, devo mantê-lo a distância. Se mantenho o outro a distância, renuncio aos prazeres de amor, companheirismo, cumplicidade, convivência.

Um paradoxo: se me separo porque me apaixono por outra ou outro, o parceiro que deixei se distancia de mim, portanto volto a idealizá-lo e a me apaixonar por ele. Por que gostaríamos tanto de idealizar o outro que vislumbramos num novo encontro? Uma nova paixão amorosa é provavelmente o sentimento que mais pode nos transformar, para o bem ou para o mal. Por exemplo, se o outro me idealiza, carrego seu ideal como um casaco novo: modifico minha postura para que o pano caia bem no meu corpo. De uma certa forma, tento me parecer com o ideal que o outro ama em mim.

Cada amor, quando começa, é uma aventura. Não porque encontro um novo parceiro, mas porque, ao me apaixonar, descubro ou invento um novo ideal e, ao ser amado, mudo para me aproximar do que o outro imagina que eu seja.

A inconstância amorosa talvez seja a expressão imediata do desejo de mudar -não de trocar de parceiro, mas de se reinventar. Não é estranho que, na hora em que um amor começa, alguém decida se dar um novo nome. Nenhuma mentira nisso, apenas a convicção e a esperança de que a paixão nos transforme.
Infelizmente, mudar é difícil: a sedução exercida pelos novos amores é uma veleidade, um pouco como as resoluções de que as coisas serão diferentes no ano que começa.

Um homem volta para o lar depois de ter estado nos braços de outra. Sua mulher pergunta: você me ama ainda? Ela tem razão, é a única pergunta que importa. Uma mulher volta para o lar depois de ter estado nos braços de outro. Seu homem pergunta: você esteve com ele? Insiste: quero a verdade. Pede os detalhes: gostou? Gozou? Onde aconteceu, em que posição, quantas vezes?

O ciúme feminino é uma exigência amorosa. O ciúme do homem é uma competição com o outro, um duelo de espadas, uma esgrima homossexual que tem pouco a ver com o amor pela amada e muito a ver com as excitantes lutinhas masculinas da infância.

6) Mentiras sinceras

Talvez a maioria dos relacionamentos amorosos adoeçam e morram por causa disto: não porque o parceiro deixou crescer uma barriga displicente nem porque a gente estaria cansado da mesmice e a fim de novidades, mas porque, ao vivermos juntos, aos poucos, perdemos a generosidade. E a generosidade é (ou, melhor, deveria ser) o próprio do amor; ela está quase sempre presente, aliás, quando a gente se apaixona. Explico.

O amor que nasce idealiza o amado, mas essa idealização é contemplativa, não é normativa. Ou seja, pedimos, eventualmente, que o amado ou a amada estejam perto de nós, mas não que mudem e ainda menos que renunciem a serem quem eles são. Claro, enxergamos neles algo que eles podem não ser, mas o encanto amoroso é justamente esse engano: "Seja como você é, pois é assim que descubro em você tudo o que quero, mesmo que talvez você não seja nada disso". Em suma, o amor, inicialmente, é respeitoso. Se você não é bem o que vejo em você, o engano é meu; amar consiste em querer e saber continuar se enganando. As coisas mudam quando começamos a medir a distância entre o ser amado e o ideal que lhe penduramos nas costas. De repente, o engano nos parece ser uma artimanha do outro; é ele que deveria se emendar para voltar a ser o ideal que inspirava nosso amor.

O encanto do começo se transforma, assim, numa lista inesgotável de pequenas ou grandes exigências. Tudo o que pedimos ao ser amado (que ele ganhe mais, que seja simpático com nossos amigos, que nos acolha com um sorriso, que pare de roncar no nosso ouvido, que leia Goethe em alemão, que não coma com as mãos, que não caminhe na nossa frente na rua, que esteja em casa na hora certa) é apenas um derivativo. O que queremos é a volta do que nós mesmos perdemos: o encanto pelo qual enxergávamos nosso ideal no ser amado. Esse encanto impunha o respeito, ou seja, permitia que deixássemos o amado e a amada serem, simplesmente, eles mesmos.

15) Ilhas desconhecidas

Encontrei a melhor definição do que é viajar numa maravilhosa e breve fábula de José Saramago, que acaba de ser publicada, "O Conto da Ilha Desconhecida" (Companhia das Letras). O protagonista explica assim seu desejo: "Quero encontrar a ilha desconhecida. Quero saber quem eu sou quando nela estiver".

Viajar é isto: deslocar-se para um lugar onde possamos descobrir que há, em nós, algo que não conhecíamos até então. Sem estragar o prazer dos leitores, só direi que, no fim da fábula de Saramago, talvez o protagonista não encontre sua ilha, mas ele encontra uma mulher. A moral da história é incerta, entre duas leituras opostas.

Primeira leitura: quem casa não viaja (a não ser de férias); casar-se é desistir de viajar. É o que pensam, com freqüência, homens e mulheres casados. E é também o que os leva, às vezes, a se separarem. Quando achamos que o outro nos impede de viajar, ou seja, que ele nos priva da aventura de descobrir o que poderia haver de diferente em nós, o casal se torna nosso inimigo. Claro, na maioria dos casos, acusamos o casal de uma inércia que é só nossa.

Exemplo: anos atrás, na França, um amigo se interessava pelas pessoas que desaparecem sem razão aparente e refazem sua vida alhures, sob outro nome, como se tivessem sido vítimas de uma amnésia repentina. Em todos os casos em que meu amigo conseguira entrevistar esses "desaparecidos", os mesmos constatavam que, depois de seu sumiço, em poucos anos, eles tinham reconstruído uma situação de vida parecida com aquela que tinha motivado sua fuga.

Segunda leitura: o protagonista descobre que a mulher ao seu lado é a própria ilha desconhecida que ele procurava e que a verdadeira viagem é o encontro com um outro amado. Faz todo sentido, pois o amor e a viagem, em princípio, têm isto em comum: ambos nos fazem descobrir em nós algo que não estava lá antes.


O outro amado nos transforma. Tanto quanto a chegada numa terra incógnita, ele nos revela algo inesperado em nós.

Por isso, aliás, o viajante e o amante podem esbarrar em problemas análogos: às vezes, ao sermos transformados pela viagem ou pelo amor, não gostamos do que encontramos, não gostamos dos efeitos em nós do amor ou da viagem. Essa é, em geral, a única razão séria para se separar ou para voltar da viagem.

Moral dessa coluna (e talvez da fábula de Saramago): os outros não são nenhum inferno, são uma viagem. Agora, para amar, como para viajar, é preciso ter determinação e coragem.

42 comments:

  1. Darinho,
    Estamos felizes por estar aqui, por fazer parte deste conjunto de sonhos e inspirações.
    Obrigada!

    abraço carinhoso,

    Vivi & Edi

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  2. Ah que bom! Bem-vindos, Ed & Vivi!

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  4. Conatus – “a vontade de viver”, “a vontade de crescer até perfeição”. Espinoza fala bastante sobre esse conceito. Ele fala que sem a intervenção de uma força externa, uma coisa ou uma pessoa só vai continuar existindo e crescendo porque é o lei de natureza, ou “direito natural” (Chauí).

    Eros – “amor intimo” Pessanha escreve sobre a relação entre logos e eros (razão e amor) nas obras do Platão.

    Arete – “excellence” “virtude” “preencher a potencial”

    Polis – “cidade” “city-state” Parece que Pessanha menciona essa palavra em relação da harmonia de uma comunidade, ou o bem-estar de um povo em relação á estrutura e seguridade que os leis de uma cidade fornecem.

    Espero que essa pesquisa ajude alguém.

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  5. Acabo de ler um artigo do BBC News que discute o amor e o casamento, bem no estilo de Calligaris. Vale a pena ler: http://www.bbc.co.uk/news/magazine-12404332

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  6. Obrigado, Caley! Deve ser muito bom!

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  7. Revised: CONCEITOS GREGOS NOS ARTIGOS

    Como eu não estou entendendo perfeitamente o português e grego nesses artigos, eu achei que seria útil para eu pesquisar os conceitos gregos enquanto estou esperando ajuda com o português.

    Há vários conceitos gregos que são usados nos artigos que estamos lendo para a semana que vem. Parece para mim, que os conceitos mais importantes são logos, pathos, e ethos. Os autores usam outros conceitos também, incluindo areté, conatus, eros e pólis.

    Ethos, pathos, e logos são os “modos de persuasão”, que Aristóteles menciona bastante quando ele fala sobre retórica. Elas são as ferramentas que se usa para convencer pelas formas escritas e faladas. São as ferramentas que se usa para construir a credibilidade com os leitores. Isso é importante porque, é alguma coisa que Vinicius faz nas suas obras. Quando ele escreve, ele escreve num jeito que convence os leitores que ele é um homem apaixonado e que paixão é um conceito poderoso e importante. Vou escrever sobre os três modos, mas na minha opinião, a ferramenta de retórica mais importante para o Vinicius seria pathos.

    Ethos – “Persuasion is achieved by the speaker's personal character when the speech is so spoken as to make us think him credible” - Aristóteles

    Se eu tivesse que traduzir a palavra ethos numa palavra, eu falaria que significa “ética” ou “moralidade”. Quando se usa ethos na retórica, se está construindo credibilidade baseada nas crenças dos leitores. Com esse ferramenta, os leitores vão ser convencidos pelas éticas que eles tem em comum com o escritor. Ou seja, ethos depende muito na comunidade ou a cultura dos leitores. Por exemplo, pode ser que o Vinicius falava sobre paixão na poesia numa maneira que tem mais a ver com os brasileiros em geral do que americanos. Então é possível que o Vinicius tenha mais credibilidade com brasileiros do que os americanos porque nossas culturas são diferentes.

    Pathos – “Secondly, persuasion may come through the hearers, when the speech stirs their emotions.” -Aristóteles

    O conceito de paixão tem mais a ver com essa ferramenta de retórica. Provavelmente é o modo de persuasão que Vinicius usa mais nas suas obras. Pathos é traduzido em vários formas. Pode ser “sofrimento”, “experiência”, “emoção”, talvez até mesmo “paixão”. Mas na verdade é uma ferramenta que se usa para inspirar essas idéias nos leitores. Quando o leitor sente a emoção certa, é porque o escritor usou pathos corretamente na obra. Por exemplo, muita gente acha que pathos significa “sofrimento” porque antigamente era usado bastante nas tragédias. O escritor queria que os leitores sentissem tristes, ou que eles chorassem, então para fazer isso o escritor escrevia num jeito que inspiraria tristeza nos leitores. Isso é importante nas obras do Vinicius. Ele queria que os leitores sentissem a importância de paixão, e que eles sentissem apaixonados igual ele.

    Logos – “Thirdly, persuasion is effected through the speech itself when we have proved a truth or an apparent truth by means of the persuasive arguments suitable to the case in question.” – Aristóteles
    Logos - é a ferramenta que provavelmente é mais importante em geral, em relação a retórica. Quando nos queremos convencer alguém, é importante que nos incluamos fatos credíveis e usemos razão. Geralmente, logos é traduzido como “razão” mesmo, mas também como “dialogo” ou “palavra” porque se só consegue comunicar razão ao leitor por um argumento bem fundamentado. Esse conceito é usado nos artigos que estamos lendo, mas não sei se essa conceito é importante nas obras do Vinicius... Talvez só no mesmo jeito que os poetas metafísicos tentariam convencer mulheres do “carpe diem”. Se usa logos para criar um argumento bem fundamentado, mas também para convencer o leitor que o escritor é fidedigno porque é conhecedor do assunto.

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  8. Greg (e quem mais precisar):
    Eu posso retirar os comentarios e substitui-los, como e quando queiram, sem problema!

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  9. E' excelente como vcs mesmos tb podem retirar os seus proprios comentarios!

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  10. Alain de Botton fala do papel crucial do humor nos relacionamentos a dois. Ele me faz pensar no papel da generosidade, de que fala Contardo Calligaris. Obrigado, Caley. Aqui segue minha passagem favorita:

    "It is surely not coincidental that most great lovers in literature are devoid of a sense of humour. It is as hard to imagine cracking a joke with Romeo as it is with Young Werther, both of them seem differently but desperately intense. And with the inability to laugh comes an inability to acknowledge the messiness and complexity of all things human, the contradictions inherent in any union, the need to accept that your partner will never learn to park the car or cook the pasta - but that you love them nevertheless.

    "Humour renders direct confrontation unnecessary, you can glide over an irritant, winking at it obliquely, making a criticism without actually needing to speak it ("By this joke I let you know that I dislike X without needing to tell you so, your laughter acknowledges the criticism")."

    Says Alain de Botton, in "A Point of View: Why books do not prepare us for real love," at http://www.bbc.co.uk/news/magazine-12404332

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  11. 1.Ter a coragem de nos apresentarmos por nossas falhas, feridas e perdas é uma sugestão válida para todos ou apenas para uma faixa etária?

    No seu blog “Amores e Mudanças”, Calligaris comenta sobre o filme “Tinha que Ser Você” explicando que a “cantada” inicial de Harvey é o oposto do fazer de conta que é a regra das relações sociais, pois Harvey apresenta-se confessando o fracasso da sua vida. A personagem do Harvey está na casa do sessenta e Kate na dos cinquenta. Podemos lembrar aqui uma cena que Castello relata em O Poeta da Paixão. Quando Gilda pergunta a VM se é verdade que está apaixonado por ela, VM responde: “É, sim” e depois de uma longa pausa acrescenta: “Mas eu não te aconselho a ficar comigo. Eu bebo muito, estou velho, meio doente. Não vale a pena. Esqueça” (402). Talvez essa coragem de que nós fala Calligaris só venha mesmo com a idade e a experiência da vida. Talvez também estas últimas nos ajudem a afastar-nos do ideal romântico dos contos de fada.
    A sugestão encontrada no blog de Calligaris “O ideal do amor romântico está em que filme?” é bastante interessante. Podemos ler: “Renunciem a ser o príncipe e a Cinderela, destinados a viverem felizes para sempre, e encarem as trapalhadas que vierem.” Outro conselho dado por Calligaris em “Ilhas Desconhecidas” é que para amar, como para viajar, é preciso ter determinação e coragem. Calligaris escreve em “Peixe Grande e a paixão pela vida” que o gosto pela vida não vem com o pacote genético. É uma paixão que nos é transmitida de maneiras diferentes, segunda a cultura, a época e a família em que nascemos. Talvez a coragem de nos apresentarmos por nossas falhas, feridas e perdas também não venha com o pacote genético mas seja fruto de uma aprendizagem, uma aprendizagem sofrida, provocada pela vida. Talvez não seja próprio da juventude ter esta coragem porque além de não ter vivido muito talvez também não tenha a distância e a experiência necessárias para enxergar as suas falhas, pois afinal toda a gente tem falhas, e também porque de facto a regra das relações sociais e talvez também a nossa falta de humildade e generosidade o impeçam.

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  12. 2. No seu ensaio “Sobre o medo”, Marilena Chaui apresenta e aborda várias definições do medo. No fim de O Poeta e a Paixão, Castello escreve que a morte-o desamparo extremo-sempre foi o grande medo de Vinicius de Moraes. Ele atravessou a vida lutando contra a sombra da morte (429). É possível dominar o medo ou o medo é parte integrante da nossa natureza?

    Embora à pergunta do que se tem medo?, Chaui escreva “Da morte, foi sempre a resposta” (34), é-nos dada uma lista de vários tipos de medo e também várias definições do medo. Para Espinosa, o medo é a mais triste das paixões tristes, caminho de toda servidão (37). Para Descartes o medo é o contrário da ousadia, um frio na alma que paralisa o corpo (38). Lemos também no ensaio que:
    O cavaleiro cristão, porém, vê-se jogado numa lição nova, desconhecida e inimaginável para seus predecessores. Nela, o medo não é o mal. Agora, o Mal faz medo. Erigida como cultura do medo, para usarmos a expressão de Delumeau, a cristandade concebe-se como cidadela permanentemente sitiada pelo inimigo do gênero humano: foi parido o Diabo (39).
    Segundo Chaui, a cultura de medo, há de ser também a cultura da culpa. (40)
    Se como Espinosa entendermos o medo como uma paixão, e seguirmos a definição de Aristóteles que lemos em O Conceito de Paixão de Lebrun de que paixões são tudo o que faz variar os juízos, e de que se seguem sofrimento e prazer e de que esses movimentos da alma são um dado da natureza humana (14) então o medo é parte integrante da nossa natureza.
    Por outro lado, considerando a cristandade e a interligação entre cultura de medo e cultura da culpa talvez possamos vislumbrar a possibilidade de dominar o medo. Pois lemos em O Poeta da Paixão que VM se sentia atraído por dois aspectos do candomblé: a exuberância dos deuses e dos ritos e a ausência das noções de culpa e de pecado. Sendo assim, uma pessoa criada no ambiente do candomblé não teria a dificuldade que VM teve em conciliar os imperativos da carne com as restrições do espírito (54). Por outro lado, a psicanálise também é uma forma de dominar o medo. Como é relatado em O Poeta da Paixão, Younis conseguiu preparar VM para a morte.

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  13. 3. “Nossa época prefere que a beleza seja fácil. E que a felicidade seja receitável” escreve Calligaris no seu blog “Felicidade e facilidade na capa”. Será possível falar em receita para a felicidade como quem fala de receita para bolo de chocolate?
    Quando trocamos receitas de culinária a primeira coisa que colocamos no papel são os ingredientes. Agora, será possível encontrar uma lista de “ingredientes” que sirva para todos alcançarem a felicidade? Será que existe uma receita universal? Pensamos aqui na definição do ciúme dada noutro blog por Calligaris. O ciúme feminino é bem diferente do ciúme masculino. A noção de felicidade também vai variar de pessoa para pessoa. Aliás, quantas vezes num casal acontece um pensar que está tudo bem e o outro estar infeliz ao ponto de querer acabar com a relação. O VM iria adorar saber que existe uma receita para a felicidade. Pois é, só que não existe! É possível falar em receita para a felicidade valendo-se até dos casais famosos que parecem estar sempre a viver num mar de rosas. O que por vez as pessoas esquecem é que chega uma hora em que as câmaras se apagam, chega uma hora também em que o casal idealizado pela imprensa acaba tudo. Então é possível falar em receita para a felicidade? Claro é possivel falar em tudo. No entanto, talvez não seja assim tão fácil encontrar a receita para a felicidade. A pergunta com que Calligaris fecha esse blog é óptima: “Ou será que essa pretensa leveza do ser é uma vassoura com a qual empurramos furiosamente nossos problemas para baixo do tapete?”

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  14. 4. Em “A paixão pelo novo e o casamento”, Calligaris escreve: “Gostaríamos de ser Indiana Jones, mas a condição de passar direto de um filme da série para o seguinte, sem os intermezzos da rotina que-supõe-se-deve constituir a vida “normal” (estudo e ensino) do professor Jones”. Será que mesmo assim não nos iríamos cansar da aventura?
    Será que o sentimento de mesmice que por vezes nos faz sonhar com uma mudança e grandes aventuras não poderia também aparecer no meio duma grande aventura? Afinal até Indiana Jones pode ficar cansado das suas buscas e pesquisas. Este tema traz também à mente a canção de António Variações “Estou Além” em que ele canta: “Porque eu só estou bem/ Aonde eu não estou/Porque eu só quero ir/Aonde eu não vou”. Sendo assim é difícil estar bem! Porque não investir então no lugar em que estamos e na pessoa com quem estamos? Talvez o melhor seja ponderar o comentário de Calligaris: “Se os esforços para manter ou reinventar o casamento nos parecessem tão emocionantes quanto a procura e o risco da novidade, o casamento encontraria um fôlego extraordinário, pois conciliaria a paixão pelo novo com a nostalgia de um porto seguro”. Mas para isso são necessárias a coragem e a generosidade de que já falámos.

    5. Uma família acaba quando ela não se reúne mais ao redor de uma mesa, não quando marido e mulher não se deitam mais juntos. Que pensar da mesa como elemento indispensável para conservar a família?

    Talvez a resposta a esta pergunta dependa da família e da cultura. Com certeza que existem famílias para quem não se juntar ao redor de uma mesa não implica o fim da família. E também existem casais em que cada um vive na sua própria casa e o casamento funciona. No entanto, a nossa cultura (portuguesa/brasileira) preza de facto uma boa comida e uma boa conversa. É ao redor da mesa que falamos do nosso dia, dos nossos sonhos, das nossas ansiedades. Por outro lado não é a reunião física ao redor da mesa que por si própria irá impedir o fim da família mas sim uma reunião em que como os convidados de Jean e Marika todos se sintam amados e benquistos.

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  15. O conto de fadas pode ter alguma influencia nos divórcios?
    No texto “De novo, divorcio e crianças” Calligaris fala da dificuldade em aceitar o fim de um casamento. Uma de suas leitoras observa que “é o casamento - e não o divórcio - que nos é vendido como conto de fadas”, e essa é uma boa observação já que passamos boa parte das nossas vidas lendo. Sempre que lemos ou assistimos a um romance ficamos emocionados no final com o “happy ending”, passamos horas lendo um livro, às vezes até dias e não queremos um final triste, queremos roubar um pouquinho da alegria do “they lived haply ever after” e acreditar, pelo menos por alguns instantes que é mesmo possível vivermos felizes para sempre. E não começamos nos romances, começamos bem antes, muitas vezes ainda nem andamos ou falamos e já estamos ouvindo as estórias da Cinderela, Branca de Neve e Rapunzel contadas pelas nossas mães, aonde os príncipes encantados vêm para salvar as mocinhas do sofrimento. Como o amor nasce no cérebro – como dizem os cientistas - e não no coração – como sonham os poetas, as ideias de casamentos perfeitos (com finais felizes) são incutidas em nossos cérebros pelos contos de fadas e romances e não queremos nadas menos que isso para nossas vidas. Aceitar o fim de um casamento é a destruir uma vida de sonhos, de fantasias que talvez nos custe mais que o próprio casamento.

    Segundo Aristóteles, citado por Lebrum,o desejo do agradável é insaciável e se alimenta de tudo, e crescerá sem medida se não for reprimido desde a mais tenra infância. Como podemos relacionar essa afirmação com a vida de Vinicius de Moraes?
    Poderia responder essa pergunta dizendo que esse “desejo do agradável para Vinicius nunca foi reprimido e que ele buscou durante toda a sua vida saciar esse desejo sem nenhuma “culpa”. Mas não acredito que isso seja uma verdade.
    Lebrum, ao falar de Aristólteles, diz que a “educação” deve nos levar a dominar nossas paixões e que num “homem bem-educado, o phatos não é uma força que colocará permanentemente obstáculos à alma razoável: ele está a serviço do logos e em consonância com ele”(16). Como sabemos Vinicius foi criado dentro de uma família católica e sabia quais as “leis que devia seguir”, portanto, acredito que a vida inteira de Vinicius foi uma batalha entre suas “pulsões” e essas leis que deveria obedecer. A sua sede infinita pela paixão o fez (e ainda faz) ser julgado por outras pessoas como uma pessoa leviana, que não estava preocupado com os sentimentos das mulheres com quem se relacionou. É mesmo dolorido quando olhamos o lado dessas mulheres (que não podemos dizer que foram vítimas de maneira alguma, dado que conheciam bem Vinicius), mas Vinicius também sofreu muito e talvez seja esse o fato de não se considerar uma pessoa feliz e também de viver com medo. Quando o julgamos, julgamos-lhe pela sua maneira de agir, mas ninguém pode imaginar a angústia, a guerra, a dor que tinha em seu coração.

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  16. Segundo Badiou, citado por Calligaris em “A coragem do amor que dura”, “o amor precisa durar um tempo porque é uma construção”. Você concorda com essa ideia?
    Concordo plenamente com a ideia de Badiou e mais, acredito que a paixão é uma fase “irracional” do amor que o tempo transformará em um amor “racional”, ou seja, quando nos apaixonamos, muitas vezes não sabemos nada sobre o outro, tudo é misterioso, envolvente, não conseguimos ver os defeitos, até a noção de tempo nos escapa as vezes. Com o tempo, com o convívio com o outro vamos aprendendo a conhecê-lo, com todos os seus defeitos, a mágica desaparece e o fogo da paixão dá lugar a um amor “morno”, e quando digo morno, não me refiro a algo sem graça, sem emoção, digo morno no sentido de “aconchegante” , é como estar por algumas horas fora de casa (no inverno nos EUA) e depois entrar em nossa casa aquecida, protetora. E acredito (pois sou muito otimista em relação ao casamento) que quando chegamos a essa fase do amor temos grandes chances de sermos muito felizes. Uma das perguntas da Natalia é: “será possível falar em receita para a felicidade como quem fala de receita para bolo de chocolate?” Eu penso que receita para a felicidade não há, mas podemos usar alguns conselhos de casais que passaram por um vida juntos, uma vida normal, cheia de atropelos do dia-a-dia, de brigas e reconciliações, de angústias, de sofrimento, de “quase separação”, mas também de pequenas e grandes alegrias, de tantos compartilhamentos, divisões e adições que ao final de suas vidas juntos já nem sabem dizer se são dois ou um.
    Sei que nem tudo o que válido para uma pessoa tem a mesma validade para outra, mas se um casal passou 60, 70 anos juntos tenho certeza que alguma lição podemos tirar dessa história de vida.

    O que podemos entender quando Badiou, em “Coragem do amor que dura” diz que quando amamos olhamos por duas janelas?
    A janela significa a vida de cada um. Quando uma pessoa olha somente pela sua janela, significa que se preocupa somente com a sua vida. A forma que com vê o mundo, faz seus julgamentos, depende somente de seus interesses particulares, suas decisões são tomadas a partir do que pensa que é certo. Sabemos que amamos alguém quando já não olhamos mais somente pela nossa janela, mas por duas janelas, a nossa e a da pessoa amada. O que a outra pessoa pensa, os seus interesses, afetam as nossas decisões. Suas preocupações serão parte das nossas, suas dores serão as nossas, sua felicidade nos fará também feliz. E o olhar por essas duas janelas faz com os casais reconstruam um novo mundo diferente do qual era visto somente por uma janela.

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  17. Em O Conceito de Paixão, Gérard Lebrum apresenta-nos diferentes teorias sobre o que é que este intrigante sentimento tem representado para o homem ao longo dos séculos. O que é que os grandes filósofos de outras eras escreveram sobre este tema e o que é que isso significa para o homem moderno? Certamente que, sem excepção, estamos todos como que submissos a este “fenómeno”, de uma forma ou de outra, mais cedo ou mais tarde, e não existe possível fuga. Resta a cada indivíduo fazer uso do seu esmerado raciocínio e reagir de forma diferente tendo em conta que isso depende da sociedade em que cada um está inserido. É óbvio que sempre existiu um certo padrão de normas de conduta a que todos nós recorremos (se bem que de formas diversas, com intensidades divergentes, dependendo da formação de cada um). Consequentemente, iremos reagir de forma diferente a cada confronto passional. Sucumbir a esse desafio ou suprimi-lo? Eis a questão!!! Achei relevantes certas passagens deste trecho, as quais passo a citar.
    Por exemplo, Lebrum salienta que, segundo Nietzsche: “Destruir as paixões e os desejos, só por causa de sua tolice e para evitar suas consequências desagradáveis, parece-me uma manifestação aguda de tolice. Não admiramos mais os dentistas que extraem os dentes para evitar que incomodem mais.”(23). É certamente curiosa esta analogia.
    Segundo Aristóteles, escreve Lebrum: “Um homem não escolhe as paixões. Ele não é, então, responsável por elas, mas somente pelo modo como faz com que elas se submetam à sua acção”. Uma interessante definição de paixão pensada por Aristóteles resume-se ao seguinte: “…tudo o que faz variar os juízos e de que se seguem sofrimento e prazer.” (14) (não posso deixar de pensar no Vinicius…e, no fundo, em cada um de nós).

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  18. O ensaio Sobre o Medo, de Marilena Chaui, deixa bem clara a ideia de que o medo – paixão triste –, “Nasce de nossa própria condição finita.” Chaui vai mais além e insinua que o medo reside na ignorância ainda que não nasça dela (59). Após percorrermos uma longa jornada através de diversos tipos e níveis de medo, sem escapar a morte, deparamo-nos com o seguinte: “Juntamente com o ódio, o medo, escreveu Espinosa, é a mais triste das paixões tristes, caminho de toda a servidão. Quem o sentiu sabe.” (37). Mais adiante, na voz de Riobaldo, Chaui cita o seguinte: ”Medo não, perdi a vontade de ter coragem”(39). Estamos habituados a pensar no medo como fraqueza de carácter. Ser medroso, afinal, nunca foi uma virtude. Somos escravos dos nossos temores, e perdemos a liberdade quando agimos por medo. Estamos perante dois pólos opostos --medo/coragem. Se é necessária a coragem para superar o medo e Riobaldo perde a vontade de ter coragem, talvez ironicamente e de igual modo, tenha perdido o medo de ter medo, o que, por sinal, é sinónimo de coragem. Trata-se apenas de mais um paradoxo como tantos outros neste ensaio.

    Por outro lado, se ponderarmos em qualquer definição de paixão, até que ponto podemos considerar o medo uma paixão? E será o medo uma paixão meramente negativa ou terá algo de motivador? Será que o medo rege a nossa conduta? Certamente que o referir-se ao medo como sendo paixão, não faz parte do nosso quotidiano. Já tivemos a oportunidade de observar que paixão engloba um conceito ambíguo. Entre outras, algumas palavras vêm à mente: sentimento excessivo, grande mágoa , vício dominador, alucinação, cólera, sofrimento. Mas ao falar de paixão também nos referimos a entusiasmo, desejo, força motivadora, inspiração. Então voltando ao ponto de partida, se o medo nasce da nossa própria condição finita, logo estamos todos condicionados por ele. Penso que o medo pode atenuar o desenvolvimento de certas acções e de alguma forma impedir a concretização das mesmas. No entanto, é possível que o medo aja, por vezes, como catalizador para a realização dessas mesmas acções. Sob este último ponto de vista, o medo toma a forma de força motivadora. Será?

    Chaui afirma ainda que, “ A cultura do medo, há-de ser também a cultura da culpa” (40). Um provérbio popular diz-nos que, “Quem não deve, não teme!”….Na realidade todos temos medo….medo da novidade, medo da mudança, medo do desconhecido. Medo, paixão ou não, sempre existiu na história da humanidade, em todos os tempos e lugares, assumindo formas de manifestações diferenciadas. E se realmente o medo reside na ignorância de cada um de nós, então talvez sejamos todos ignorantes. E tendo a sensação de ter escrito demais e dito pouco -já que estamos a filosofar- aproveito a oportunidade para citar Sócrates, ou deva dizer, Platão, na Apologia de Sócrates: “Eu só sei que nada sei”.

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  19. 1. Uns dizem que a paixão é bom, outros que é mau, outras que é a sua inspiração e outros que é a sua morte. Todos definem a paixão diferente é como aquele ditado “beauty is in the eye of the beholder”, ....... a paixão está no coração do apaixonado, é então por isso que cada um de nós tivemos uma definição diferente quando o professor nos fez a pergunta “que é a paixão? Mesmo embora que as nossas explicações eram diferentes, o que Hegel nota “No Conceito de Paixão” sobre a paixão está certo “Nada de grande se fez sem paixão.” Se pensamos bem não só na vida amorosa mais também nas paixões da vida geral, isto faz muito sentido. Todo o que se faz com paixão torna-se grande. Uma paixão de um escritor é escrever, a paixão realiza-se num livro. As grandes paixões do Michaelangelo eram pintar, esculpir e construir arte que ainda hoje é maravilhosa, sem paixão ele não teria sido tão bem sucedido. Podemos dizer a mesma do Vinicius De Moraes, podemos dizer que as suas paixões eram as suas mulheres, as suas obras e o seu uísque e no caso deles todos, ele viveu essas paixões com grandeza.
    2. No artigo da Receita de Mário Tatini, Calligaris comenta no que se passa no restaurante e que “trata-se do lugar público que celebra o âmago da intimidade: a mesa. E sinto para quem pensa que esse âmago seja a cama: uma família acaba quando ela não se reúne mais ao redor de uma mesa, não quando marido e mulher não se ditam mais juntos.” A cozinha em geral fica no centro da casa e acho que muitas casas são construídas assim porque é o quarto onde todos podem encontrar. Mas mais do que isso é o conceito de todos sentirem-se bem ao redor de uma mesa com comida e bebida boa. Seja lá o que for a conversa, todos sentem-se bem, é uma intimidade que é difícil reproduzir em outro lugar. Pode ser uma intimidade entre homem e mulher ou pais com filhos. Hoje em dia é um conceito que não se vê muito porque os nossos horários estão sempre cheios, muitas famílias hoje em dia é raro comer em casa, é triste mas é a realidade. Quando uma pessoa tira tempo para cozinhar para a sua família, é por amor não é por obrigação, esse amor espalha-se pela cozinha e também na comida e é esse amor que a família sente-se quando estão ao redor da mesa é esse amor que mantenha uma família unida.
    3. Felicidade e Facilidade na Capa: As revistas e os programas de televisão estão sempre a quer inventar novos conceitos ou novos remédios para facilitar as nossas vidas, mais isto todo é só um negocio para fazer mais dinheiro. Todos sabem ou devem sabem que a vida não é assim tão fácil e a felicidade também não é tão fácil. A felicidade, como a paixão é um sentimento diferente para todos. Não há receita igual para todos que vai nos dar felicidade. O que me faz feliz é diferente do que faz a minha vizinha feliz. A felicidade de Vinicius era apaixonar-se por muitas mulheres e estar ao redor de uma mesa com os seus amigos bebendo uísque. A minha felicidade é apaixonar-me por um homem e estar ao redor de uma mesa com a minha família.

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  20. 4. Amores e mudanças: A pergunta sobre a mudança neste artigo é interessante. “O amor surge quando está na hora de a gente se transformar ou então é por amor que a gente se transforma?” Acho como diz no artigo, as duas poderiam ser verdade. Por exemplo um casal que esta sempre a discutir sobre um assunto qual quer chegam a um certo ponte que se querem ser felizes ou se querem continuar juntos têm que mudar. Nesta situação o amor surge que está na hora de se transformar. No caso do Harvey e da Kate se eles se transformam é por amor (ficamos sem saber se eles ficarão juntos). Mas ainda mais interessante é que o amor quando está presente é tão forte que tem capacidade de transformar as pessoas. Podemos dizer a mesma sobre a paixão. A paixão também pode transforma as pessoas, para o bem ou para o mal. As pessoas são capazes de ultra passar qual quer obstáculos por amor ou paixão, é esses temas que fazem uns bons romances.
    5. O ideal de amor romântico está em que filme?: É possível a paixão durar para sempre? Nos filmes parece que sim, mas sabemos que os filmes não é a realidade. Talvez se os filmes continuassem depois do grande beijo no fim, talvez virmos que a paixão não durava. Eu acho que em relação a vida, quando uma pessoa perde a sua paixão para viver é possível que eles possam viver ou sobreviver mas que morrem por dento, no coração, a vida já não é a mesma para eles. Nesse caso a paixão não dura para sempre. Acho que a paixão muda durante tempo e são essas mudanças de paixão que ajudam-lhe a permanecer. Por exemplo um casal que estão apaixonados, no início, a paixão é forte, mas depois começam a ter filhos e embora ainda estão apaixonados não é com aquela intensidade como era. Depois a vida muda outra vez e os filhos já não estão a viver em casa, o casal agora sente outra vez aquela paixão intensa que tinham no início. Mais tempo passa e o casal fica mais velho e chega a um certo ponte que intensidade não está presente mas ainda podemos ver no olhar deles um para o outro que a paixão ainda existe e que só acabara quando um deles morre.

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  21. Resposta do post “Ilhas desconhecidas”

    Se você deixa de viajar quando se casa, o Vinícius mudou de cidadania vários vezes na vida!

    Eu achei muito interessante esse post do Calligaris que refere a imagem da mulher como um país ou uma outra terra, descrito tão elegantemente na obra do John Donne. No post, Calligaris propõe que depois de casar, nós deixamos de conhecer lugares novos (no sentido de mulheres) onde poderíamos aprender mais sobre nos. O casamento seria a morte de aventura e descoberta. O casamento seria o fim da busca para aquela ilha desconhecida, o lugar onde poderíamos nos encontrar de verdade. Ou talvez, a ilha desconhecida seja aquela ilha que você já conhece bem. Os dois lados são interessantes. Agora, onde é paixão nessa metáfora grande?

    Na minha opinião, paixão é aquele sentimento que Vinícius queria na vida. Não felicidade, mas só o sentimento de estar vivendo mesmo. É isso que nos sentimos quando nós conhecemos um lugar novo. Quando se tira fora da vida que conhece e se coloca numa situação ou lugar completamente diferente, se fica animado e aprende mais sobre si mesmo. Pode acontecer também com uma pessoa. “New land, George” Será que é a pessoa certa? A ilha desconhecida? Parece que na vida de Vinícius, ele sentiu essa paixão de auto-descoberta pelo amor de vários mulheres. Ele conheceu nove "ilhas desconhecidas"!

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  22. – Nietzsche – Vinícius – Pessoa

    Ao ler sobre Vinícius e a paixão tenho pensado frequentemente em Nietzsche e Pessoa. Bem, é melhor ir por partes: vou começar por falar um pouco da relação entre Nietzsche, música e a paixão; depois virá Vinícius – e talvez Pessoa.
    1. Nietzsche
    A distinção sugerida por Nietzsche em “A Visão Dionisíaca do Mundo,” fundamental mais tarde na Origem da Tragédia, estabelece uma separação que coloca de um lado a poesia e a música, consideradas como artes dionisíacas, e do outro a imagem e a poesia épica, as artes apolíneas. As artes apolíneas estão, na concepção nietzscheana, ligadas ao proporcional, a uma arquitectura equilibrada; as artes dionisíacas são aquelas em que se revela o excesso, o impulso, a paixão, etc... José Miguel Wisnik, no contexto da leitura que faz da ópera de Wagner, apresenta uma interpretação bastante nietzscheana do canto de Isolda ao ler o seu surgimento no momento crucial do filtro amoroso como sugestão de que “a paixão só se diz, em última instância, pelo canto, pela música” (235).
    2. Vinícius
    Provavelmente o Vinícius estaria de acordo com esta visão da música como uma arte em que se revelam os impulsos dionisíacos, as emoções e se diz a paixão. Sinceramente não sei qual era a relação entre Vinícius e o pensamento de Nietzsche; mas a forma como Vinícius constrói a sua música e a sua poesia com base nas suas sensações, nas suas emoções, colocam-no numa posição próxima daquela que ocupa o artista dionisíaco em Nietzsche. Vinícius, ao contrário dos estoicos (sobre os quais Nietzsche chegou mesmo a perguntar se ainda eram Gregos, por se afastarem tão vincadamente de uma visão dionisíaca) não parece ter procurado refrear as suas paixões. Ele não procurou lutar contra as “perturbações da alma” (para usar a expressão de Lebrun); Vinícius alimentou-se dessas perturbações para as transformar em arte, traduzindo-se assim num artista que construiu a sua obra com base e a partir desse impulso dionisíaco. Para tal ele precisou da vida e da paixão, para poder a partir de ambas sentir, escrever e compor.
    3. Pessoa
    Vinícius foi assim o oposto e simultaneamente o mesmo que o poeta que sentiu “tudo de todas as maneiras.” Estou agora a lembrar-me de Pessoa, claro. Daquele pessoa sensacionista que tal como Álvaro de Campos escreveu teve a consciência claríssima de que “não há Índia se não a alma em [si].” Vinícius, mesmo que nunca tenha tido essa consciência, demonstra como as paixões que viveu importaram pelas sensações que criaram, e pelo impulso artístico subjacente a essas mesmas sensações. Pessoa, porém, não precisou de viver para sentir; Vinícius precisou de viver para sentir e para criar. Une-os a sensação e, de alguma forma, separa-os a vida e a imaginação.

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  23. – Nietzsche – Vinícius – Pessoa – Paixão

    Ao ler sobre Vinícius e a paixão tenho pensado frequentemente em Nietzsche e Pessoa. Bem, é melhor ir por partes: vou começar por falar um pouco da relação entre Nietzsche, música e a paixão; depois virá Vinícius – e talvez Pessoa.
    1. Nietzsche
    A distinção sugerida por Nietzsche em “A Visão Dionisíaca do Mundo,” fundamental mais tarde na Origem da Tragédia, estabelece uma separação que coloca de um lado a poesia e a música, consideradas como artes dionisíacas, e do outro a imagem e a poesia épica, as artes apolíneas. As artes apolíneas estão, na concepção nietzscheana, ligadas ao proporcional, a uma arquitectura equilibrada; as artes dionisíacas são aquelas em que se revela o excesso, o impulso, a paixão, etc... José Miguel Wisnik, no contexto da leitura que faz da ópera de Wagner, apresenta uma interpretação bastante nietzscheana do canto de Isolda ao ler o seu surgimento no momento crucial do filtro amoroso como sugestão de que “a paixão só se diz, em última instância, pelo canto, pela música” (235).
    2. Vinícius
    Provavelmente o Vinícius estaria de acordo com esta visão da música como uma arte em que se revelam os impulsos dionisíacos, as emoções e se diz a paixão. Sinceramente não sei qual era a relação entre Vinícius e o pensamento de Nietzsche; mas a forma como Vinícius constrói a sua música e a sua poesia com base nas suas sensações, nas suas emoções, colocam-no numa posição próxima daquela que ocupa o artista dionisíaco em Nietzsche. Vinícius, ao contrário dos estoicos (sobre os quais Nietzsche chegou mesmo a perguntar se ainda eram Gregos, por se afastarem tão vincadamente de uma visão dionisíaca) não parece ter procurado refrear as suas paixões. Ele não procurou lutar contra as “perturbações da alma” (para usar a expressão de Lebrun); Vinícius alimentou-se dessas perturbações para as transformar em arte, traduzindo-se assim num artista que construiu a sua obra com base e a partir desse impulso dionisíaco. Para tal ele precisou da vida e da paixão, para poder a partir de ambas sentir, escrever e compor.
    3. Pessoa
    Vinícius foi assim o oposto e simultaneamente o mesmo que o poeta que sentiu “tudo de todas as maneiras.” Estou agora a lembrar-me de Pessoa, claro. Daquele pessoa sensacionista que tal como Álvaro de Campos escreveu teve a consciência claríssima de que “não há Índia se não a alma em [si].” Vinícius, mesmo que nunca tenha tido essa consciência, demonstra como as paixões que viveu importaram pelas sensações que criaram, e pelo impulso artístico subjacente a essas mesmas sensações. Pessoa, porém, não precisou de viver para sentir; Vinícius precisou de viver para sentir e para criar. Une-os a sensação e, de alguma forma, separa-os a vida e a imaginação.

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  24. Resposta do post “Melhor não conhecer quem você ama”

    Eu estava pensando o outro dia sobre paixão e o sentimento animado que se sente quando começa a namorar. Nos primeiros momentos da relação, tudo é emocionante. Você não sabe se vai gostar da pessoa, mas qualquer coisa que aconteça, você está aprendendo sobre a pessoas mais e mais. Eu acho que paixão começa quando você está gostando da pessoa mais a relação ainda tem mistério. Infelizmente, um dia não vai ter muito mais a aprender sobre a pessoa. Calligaris mostra no post dele que muita gente termina as relações por causa dessa falta de mistério. Para fornecer soluções, ele só escreve sobre alguns filmes com situações semelhantes. Será que esse conhecimento completo do amante vai culminar no fim da relação?

    Eu espero que não... Eu acho muito triste essa idéia que todos nós queremos ser conhecidos profundamente, mas isso vai destruir as nossas relações. Não quero mentir sobre a minha vida para preservar o meu mistério. Eu também não gostaria de ser Jason Bourne e saber nada do passado só para ter a chance de uma relação interessante. Enquanto eu achei esse post do Calligaris interessante, eu não acho que alguns filme tem a solução da falta de mistério em nossas relações. Na minha opinião, muitos casais (especificamente americanos) passam tempo demais juntos. Americanos acham que casados tem que ser melhor amigos, portanto eles também tem que ficar juntos o tempo todo. Muita gente fala que o casal perfeito é dois pedaços de um todo. Que ridículo. Então eu só era metade de uma pessoa antes de conhecer a mulher perfeita? Não... Para manter o mistério, você não tem que mentir, não tem que manter o espaço e não conhecer o amante. Você só tem que continuar com sua vida. Você tem que continuar fazendo as coisas que gosta, encontrando com as pessoas que gosta. Quando um casal na verdade é duas pessoas com gostos diferentes e sonhos diferentes na vida, dá para manter o mistério sem fazer algum sacrifício. Gostei muito dessa observação do Calligaris, mas eu acho que teria sido possível para ele criar uma solução desse problema de intimidade.

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  25. Os ensaios de Calligaris procuram demonstrar condições concretas da vida relacionadas com casamentos, levantando questionamentos que revelam os processos sociais que ocorrem por detrás do texto. Estes ensaios servem de instrumento para reforçar e exemplificar o conceito de casamento, uma das instituições mais antigas e, por isso, exige uma reinterpretação que valorize e dignifique o casamento.
    Questionamos então: O que é o matrimónio?
    Segundo a guia do casamento, namoro, paquera, amizade e sexo, o casamento é o vínculo estabelecido entre duas pessoas mediante o reconhecimento governamental, religioso ou social e que pressupõe uma relação interpessoal de intimidade cuja representação arquetípica são as relações íntimas.
    As pessoas casam-se por vários motivos, mas geralmente fazem-no para dar evidência à sua relação afectuosa, para buscar equilíbrio económico e social, para formar família, procriar e educar sua prole e legitimar o relacionamento sexual.
    Para justificar esta minha afirmação, entrevistei três colegas de trabalho, os quais possuem idades e anos matrimoniais bastante relativos. A questão foi muito simples. Porque decidiram casar? Como definem o casamento?
    Débora, casada há sete anos.
    O casamento para mim é um compromisso entre duas pessoas, principalmente quando se amam. Decidi casar porque eu queria constituir família, e para mim o casamento é isso: família. Também é uma relação mais séria porque nos dedicamos só a uma pessoa e o divertimento é diferente porque o casamento acarreta muitas responsabilidades. Não há decisões a um mas sim a dois. Há partilha em todos os aspectos de uma vida conjugal. As atitudes também mudam, pois como mulher casada o comportamento sofre alterações, isto é, penso antes de agir.
    Gisela, casada há vinte e um anos.
    Decidi casar simplesmente porque queria ser mãe. Queria que o meu filho crescesse com os dois pais. O casamento para mim é sinónimo de paciência, dedicação à mesma pessoa. Casamento é sacrifício. Um indivíduo quando se casa a vida troca por completo, porque a pessoa não é totalmente livre, estamos presos e dependentes de outrem. Casamento também é ter uma companhia, é nunca estar só.

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  26. Paulo, casado há 37 anos.
    Casamento para mim e partilhar a vida com alguém muito especial. A tua melhor amiga com a qual partilhas os momentos mais íntimos e os momentos mais felizes e menos felizes. Casei-me porque a sociedade assim o exigiu. No meu tempo, o casamento era o acto mais correcto que se podia cometer. Para vivermos com a pessoa amada, o casamento era imposto não só pela família mas também por toda uma sociedade. Para ter um casamento sério, também não era bem visto aos olhos dessa sociedade se fosse namoradeiro. Como tal a minha esposa foi a única namorada que eu tive e vice-versa.

    Eu casei para me libertar. Meu namoro foi um namoro de janela, isto é, eu à janela do segundo andar e ele de pescoço levantado. Queixava-se da dor de pescoço. Havia muitas regras. Subordinação aos pais. Meus pais amavam-me muito, mas muitas coisas que eu gostaria de fazer eram-me proibidas. Por exemplo uma simples ida ao cinema. Era necessário requisitar quase uma esquadra inteira para nos escoltar. Uma família muito tradicional. Casei cedo, por amor, mas principalmente para podermos voar. Decidir sem justificar. Só que, tudo isso é um engano, porque a gente não se liberta, a gente se prende ainda mais, porque as responsabilidades fazem com que as decisões a ser tomadas têm que ser a dois e, há que ter em conta as divergências.
    Tal como em Lísis em Sócrates. Os pais não lhe deixavam fazer aquilo que ele desejava. Um futuro cidadão de Atenas com todo o direito à liberdade não é livre de fazer o que quer. “ No Lísis já encontramos, portanto, a formulação da tese platónica de que o amor possível, escravizante, avassalador, contrapõe-se outro tipo de amor: aquele baseado no aprendizado, no saber. E que liberta” (95).
    Não sei se concordam comigo, mas em suma, julgo poder afirmar que os meus colegas também casaram para se libertar. Para descobrir o desconhecido, para concretizar um desejo. Tal como Calligaris nos exemplifica através de quinze textos baseados em telas de cinema, que o casamento é uma aventura, uma viagem, uma novidade a descoberta.

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  27. 1. A paixão pelo novo e o casamento
    “Queremos novidade em nossas vidas.” De facto procuramos a variedade, podemos até usar a palavra: desconhecido. Moldamo-nos à pasmeirice da tradição, dos conceitos incutidos pelos nossos progenitores. Temos uma responsabilidade porque o casamento a promove. Casou, acalmou. Acalmou e por vezes uma calma enjoativa que leva à monotonia e ao comodismo. Dá-se assim, inicio a uma vida rotineira, a não procura de aventura. Tal como Calligaris menciona: “O Porto Seguro.”
    2. “Peixe grande” e a paixão pela vida
    “Transmissão da paixão pela vida de um pai para filho. O gosto pela vida não vem com o pacote genético: é uma paixão que nos é transmitida de maneiras diferentes, segundo a cultura, a época e a família em que nascemos.” Concordo. Sou mãe de dois filhos, e como tal, não sou diferente de meus progenitores ao transmitir-lhes os valores da vida, principalmente os valores familiares em que nasci e acima de tudo faço-o com paixão. “Filho és pai serás, consoante vires assim farás.” Será que todos nós curtimos uma paixão? Podemos considerar-nos seres apaixonados? São duas questões que dariam uma tese. Como ser, acredito que todos nós temos uma paixão e que essa é nossa razão de viver.
    3. Vicky Cristina Barcelona
    “Percalços da vida amorosa” quem os não tem? A paixão acontece quando menos esperamos: um clique, uma química, uma combustão e, eis a confusão. “Doidice da paixão.” Será que somos todos um pouco de todas as personagens do filme? Podemos relacionar-nos sim com as personagens, porque elas se apaixonam, vivem sentimentos fortes, brincam com a paixão (Cristina), sem perder a ilusão da liberdade ou do sonho “ do que se pode encontrar na próxima esquina.”
    4. “Closer- perto demais:” Por que somos infelizes no amor?
    a)“Impotências e incompetências sentimentais” Somos infelizes no amor porque ao longo do nosso trajeto encontramos sempre obstáculos que atrapalham a concretização do amor na sua totalidade.
    b) “Perto demais” sufoca. Uma relação necessita de espaço. Respeito pelo espaço do parceiro. O sentimento de vazio, de falta, matem viva a chama do desejo do outro.
    c) “Desgaste amoroso”. Preciso de espaço. Você me sufoca. Preciso viver a vida, etc… ou seja, a seu lado não há novidade, não há aventura, não há mudança.
    Em suma, quem age assim acaba só.
    5. Mentiras sinceras
    “Minto quando escondo minha paixao por outro ou por outra? Ou, então, a verdadeira mentira é o casamento que vivo e a insatisfacao que escondo?”
    Concordo com Calligaris quando afirma que “ser sempre sincero não é fácil.” Neste caso o apaixonado vive um turbilhão de sentimentos contraditórios. Isto é, o gozo de estar com o amante e o quão fácil é, porque são actos momentâneos sem responsabilidades. Do outro lado o casamento que lhe exige entrega total e responsabilidade. Estes dois sentimentos fazem com que o apaixonado encontre defeitos algures para justificar os seus actos.
    6. Amores e mudanças
    “O amor surge quando está na hora da gente se transformar.” Será? Nem sempre. Às vezes surge numa altura em que não há necessidade de transformação. Mas muitas vezes arriscasse. “Quem não arrisca não petisca.” O ato de arriscar é um ato de coragem.
    Quanto ao “engate,” como o podemos classificar. O meu “engate difere um pouco do engate de Calligaris. Quando se saía e se comentava, vamos ao “engate,” sabia-se de ante mão que se buscava um parceiro ou parceira para uma relação, nem que mais não fosse momentânea. Recordo-me nos meus tempos de juventude, nas saídas para um dos bailaricos da Terra, na garagem do vizinho, pertinho de casa, ir para o “engate,” isto é, talvez um príncipe encantado aparece-se por lá! Como eu, havia dezenas ao “engate.” O termo “engate”era mais usual para os rapazes. “Hoje vou ao engate, estão cá umas garotas da França!” “New land George,” terra nova e mulher nova como Calligaris nos apresenta em Ilhas desconhecidas.

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  28. 7. Ilhas desconhecidas
    “O amor e a viagem nos fazem descobrir que há algo, em nós, que não conhecíamos até então.” Ou como um jogo de cartas. Só depois de dadas as cartas, é que sabemos com que jogo, jogamos. Esta viagem é um a transformação, podemos gostar ou não dessa transformação. No gostar é que está nosso destino. Se gostamos da viagem, voltamos, se não gostamos da viagem, simplesmente esquecemos. Em relação ao amor, acontece exactamente o mesmo. “Para amar e para viajar é preciso determinação. O amor e a viagem têm isto em comum: ambos nos fazem descobrir em nós algo que não estava lá antes.” Mas viajar fica muito dispendioso, e como tal “quem casa não viaja (só de ferias), casar-se é desistir de viajar.” Infelizmente é o que muitos casais consideram e, é também, uma das causas de divórcio. Em suma, Calligaris manda-nos viajar, e muito. “Fugir do passado, recomeçar de novo segundo uma nova identidade.”

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  29. (…) o diálogo que leva ao amor, que dá a cada um a vontade de se arriscar, não surge da sedução e do charme, mas da coragem de nos apresentarmos por nossas falhas, feridas e perdas.
    Terá sido este, o modelo de vida adoptado por Vinicius?
    De algum modo esta visão de Calligaris na sua crónica Amores e Mudanças é um reflexo de uma definição de amor e de paixão, ou seja, a capacidade de nos apresentarmos como somos, embora o outro nos veja como quer. É o que acontece com Vinicius ao longo da sua vida, pois de maneira alguma olharemos para o poeta como alguém que mascarou a sua própria existência, personalidade e forma de estar na vida, dando a entender a todas as pessoas que cruzaram a sua vida de que esse era o seu verdadeiro “eu” e que não iria mudar, independentemente do país ou da pessoa com quem vivia. Mas então o que viram nele, tantas mulheres e homens que de uma maneira ou de outra se apaixonaram por ele? Talvez Aristóteles nos pudesse ajudar a responder a esta questão, mas penso que é com Platão que melhor compreenderemos esse lado de Vinicius, afinal de contas, para o filósofo o amor é um tema que “permanece inconcluso, aberto sempre à possibilidade de novas variações” e são essas mudanças que moldaram a vida criativa do poeta.

    (…) Daí o sucesso moderno do amor como motor do agir humano: ele é uma razão perfeitamente subjetiva. O que fazemos por amor, fazemos por nós mesmos. Amando, não obedecemos a ninguém, se não à paixão que é nossa (…)
    In http://contardocalligaris.blogspot.com/1994/08/servido-ao-amor-desafia-esprito.html

    Calligaris descreve nesta passagem quais os elementos-chave que melhor definem o amor e a sua importância na vida de cada um de nós. Mas é motor exclusivo ou se deve ser complementado por outros motores, como a família e o trabalho?
    De facto o amor, é um dos motores da acção humana, mas não é exclusivo da modernidade, uma vez que é o tema que mais discussão e problemáticas tem colocado aos filósofos da história da humanidade, sobretudo sobre a sua origem e consequências nas acções do Homem. A paixão, o amor, a raiva, enfim, os sentimentos mais subjectivos ou objectivos são eles o reflexo de uma vivência, talvez como Espinosa fala, de movimentos contrários do ser humano, mas que na minha opinião definem a vivência e que sem eles a mesma não existiria. Resta então saber como é que aquilo que fazemos por amor, fazemos por nós?
    Provavelmente Vinicius diria que o fazemos para que nos possamos inspirar e criar durante a vida, são sobretudo vivências, se possível repletas de emoções e fortes. Devemos procurar tal como ele o fez, uma vida que tenha e que faça sentido para quem a experimenta. Mas quantos de nós se abstêm dessas experiências? Serão esses, seres desadaptados ou simplesmente seres que têm medo? Mas não é o medo, uma das fases da paixão? Enfim, a vida é um espaço de descoberta e de mistério e o amor, é apenas uma dessas vertentes que, na minha opinião, deve ser experimentado ao máximo, não pelos outros, mas por nós permitindo-nos a redescoberta do mundo, de nós e dos outros.

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  30. (…) No restaurante, é fácil esquecer os limites entre espaço público e espaço privado, pois trata-se do lugar público que celebra o âmago da intimidade: a mesa. E sinto para quem pensa que esse âmago seja a cama: uma família acaba quando ela não se reúne mais ao redor de uma mesa, não quando marido e mulher não se deitam mais juntos. (…)
    In http://contardocalligaris.blogspot.com/2008/12/receita-de-mario-tatini.html

    Esta é uma das passagens de Calligaris que mais me fez pensar em Vinicius e na biografia que lemos anteriormente, levantando-se constantemente a pergunta se seria a mesa a melhor definição de vida familiar para Vinicius ou se para o poeta a mesa era simplesmente sinónimo de criação e de descoberta de novos “mundos”?
    Na realidade a noção imediata de família passa pelo momento das refeições, no qual as famílias ditas tradicionais se reúnem à volta de uma mesa e partilham, não só uma refeição, mas sobretudo as vivências de um dia de trabalho, de escola ou de um dia passado em família. É o espaço por excelência onde se dá a conhecer e se conhece melhor aqueles que connosco partilham uma vida. Mas será mesmo sinónimo de boa saúde de uma família? Duvido, até porque nos dias de hoje a vida é de tal maneira atribulada que os membros de uma mesma família podem partilhar a mesma cama, mas a mesa é algo que durante uma semana é quase sempre impossível, ora porque o pai chega mais tarde e amanhã é dia de escola, ora porque estão de tal maneira cansados que preferem passar num fast food e seguir para casa.
    Contrariamente, a mesa para Vinicius não era espaço familiar no sentido mais tradicional da palavra, era sim, um espaço de troca de ideias com aqueles com quem se foi cruzando ao longo da vida (e por quem se foi apaixonando, porque não?), chegando mesmo a ser o espaço onde o poeta encontrou novas musas de inspiração, quebrando desta forma a magia que Calligaris imprimiu na noção de mesa e de família. Contudo, concordo que a família não acaba porque o casal não se encontra mais na cama, pois amor e paixão não são sinónimos imediatos de sexo, tal como pudemos aprender com Vinicius: a veneração é ela muitas vezes a forma suprema de paixão e essa excluí o sexo, dando primazia à contemplação e à admiração do outro ou como, diriam os filósofos, de uma maneira de contemplação daquilo que nelas vemos e que nem sempre corresponde ao que a pessoa vê de si e ao que os outros nela vêem.

    Para Kipnis, diante da vida de casal (e no meio dela), nossa ambivalência é sem solução: "Por um lado, o anseio por intimidade; por outro, o desejo de autonomia; por um lado, o conforto e a segurança da rotina; por outro, sua medonha previsibilidade; por um lado, o prazer de ser conhecido profundamente (e de conhecer profundamente outra pessoa); por outro, os papéis restritivos que essa familiaridade prevê".
    In http://contardocalligaris.blogspot.com/2005/11/melhor-no-conhecer-quem-voc-ama.html

    Podemos ou não ser felizes no casamento?
    Para Vinicius essa felicidade não é eterna e teremos que partir em busca dela sempre que a mesma decidir abandonar o casal. Mas o que tem a ambivalência de sentimentos a ver com o casamento? Tem tudo, pois é a ambivalência de sentimentos e desejos que alimentam a vida, que nos fazem procurar ultimamente a paixão e o amor. Calligaris afirma que o amor é um sentimento que fomenta a idealização do outro, é um facto, mas é simultaneamente um estado de alma que nos idealiza a nós mesmo, através dos olhos do outro e os nossos, isto porque temos uma tendência quase que automatizada para nos moldarmos de maneira a satisfazer a imagem de têm de nós: mudamos de hábitos, de estilo de vida, de linguagem, tantas vezes de amigos, mas no fundo nunca deixamos de ser nós, seres dotados de individualidade e de personalidade que a dado momento se revela ao outro, demonstrando que muito provavelmente esse outro não nos conhece tão profundamente como imaginado e desejado.
    A ambivalência de sentimentos numa relação é o motor da vivência e, como tal, alimenta a paixão e tudo o que dela advém.

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  31. Faz todo sentido, pois o amor e a viagem, em princípio, têm isto em comum: ambos nos fazem descobrir em nós algo que não estava lá antes.
    In http://contardocalligaris.blogspot.com/2007/11/ilhas-desconhecidas.html

    É deste modo que Calligaris melhor define o amor em Vinicius ou será este um aspecto comum a cada um de nós?
    Para o poeta o amor e a viagem andaram sempre de mãos dadas, complementando-se e questionando-se continuamente a cada momento e a cada nova passagem, ou melhor, a cada viagem. Resta a dúvida se nos fazem descobrir algo que não estava lá ou se simplesmente estava lá não o víamos? Inclino-me mais para a segunda hipótese, pois considero que o “eu” está já formado, só não o conhecemos na totalidade e, é aqui que entram todas as discussões filosóficas sobre este tema, ainda não encerrado e que muitas e novas discussões irá trazer à sociedade. Mas se para Platão amor e discurso estão interligados, será que viagem (metafórica ou não) e amor não estarão eles também interligados? Isto porque se pensarmos na vida de Vinicius e de tantos outros, a palavra foi a forma escolhida para expressar perante os outros o amor e a paixão, o que por ele se entendia e se sentia, revelando as viagens que todos fazemos na vida (viagens interiores ou no verdadeiro sentido da palavra) descobrindo novos mundos, novas paixões, ódios, amores, cumplicidades e, mais tarde, novas maneiras de falar.

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  32. “Ē justamente a capacidade de amar, de sentir o amor como perda e gozo, de temer não ser amado, que separa o sensível do mediocre. Experiêcia decisive, e que por isso mesmo não sucede todos os dias: nada mais longe de Stendhal do que esses “eternos apaixonados,” hoje por uma pessoa, amanhã por outra.” (p. 489, Ribeiro) Aqui, Ribeiro descreve a essência do amor romantica, uma relação dos amantes destinado de se amar. E um retrato ideal do amor, sem complicações do amor pagão, um alcance maravilhoso dos duas almas consegrado num amor perfeito.
    “A vontade é uma vitória sobre o desejo, pois este almeja objetos externos, e por isso a única satisfação que alcança é um sursis: a posse da mulher que me atria, para dar um exemplo, só me sacia por um prazo limitado; volto depois a deseja-la, ou passo a querer outra mulher; e o mesmo vale para todos os objetos de desejo.” (p. 493, Ribeiro) Aqui, Ribeiro descreve a relação entre vontade e desejo, uma confirmação das duas forças lutando na alma do homem. Para Ribeiro, uma mulher “da” oportunidade de ter uma vitória da vontade sobre o desejo – na verdade, uma separação das duas tendências na mente do homem.
    “Mas talvez seja ainda mais trágico o herói apaixonado. Porque a revolucionário de algum modo ainda compactua com o mundo, com a sociedade que pretende salvar ou criar. Já o apaixonado está em conflicto direto com a sociedade, com qualquer sociedade – conflito ainda mais grave porque sua arma é a indiferença, o descaso face aos poderes.” (p. 496, Ribeiro) Essa descrição da posição do herói na sociedade é tão inteligente. Para Ribeiro, o herói é uma figura tão trágico, rasgada para os interesses do amor e da sociedade no mesmo tempo. No fim, o amor da amante e da sociedade é reconciliável, na exultação das duas – aqui, o “amor” de Ribeiro é um amor de reconciliação, um abraço da sociedade, comunidade, e o herói. Essa idéia de revolução positiva é um exemplo de cumprimento do herói, num contexto judeu-cristã.
    Num outro lado, tem a história de Tristan é Isolde, um opera de Wagner. Wisnik diga: “Este ponto crucial dá bem a medida, a meu ver, da ambivalêcia do mito como campo de cruzamento de interpretações: é essa intertextualidade pagã-cristã que produz a história da paixão, onde a espada se lê como sexualidade e castidade.” (p. 237, Wisnik) Nessa maneira, Wisnik descreve o outro lado do amor, num context “pagã-cristã,” totalmente diferente da idéia romantica judeu-cristã. Naturalmente, essa percepção do amor pagã quase-violenta oferece comentário sobre o conceito de “paixão ‘qua’ paixão.” Nessa interpretação do amor em Wagner, é importante de lembrar a noção de paixão complicada para as forças gregas, num síntese dinâmico do amor diferente. Aqui, a emissão de “amor violento” é importante.
    Finalmente, Gérard Lebrun escreve na sua obra “O Conceito de Paixão”: “Somente quando os limites impostos as corpo forem sentidos com afetos de tristeza e sua expansão for sentida com afetos de alegria,…o combate entre as paixões mudará de curso e das paixões alegres passaremos às ações. Aqui encontramos uma das mais extraordinárias concepções do conhecimento: pensar é alegria e contentamento, ou aumento de perfeição e realidade…Reconciliação de nossa alma consigo mesma e com nosso corpo, dele consigo mesmo e com nossa alma e de ambos com a Natureza e a sociedade livre.” (p. 80, Lebrun)
    Aqui, nas palavras de Lebrun, é possível de ver os ecos do conceito do herói na sociedade: o cumprimento de herói é a santificação da comunidade num contexto amoroso. No fim, a posibilidade existe de salvar um senso de amor ética das forças gregas de paixão. A alegria da comunidade é só possível com a loucura grega de herói, mas no fim, é possível de dizer que a força do amor ética representa a posibilidade de vencer o amor estrênuo grego, de Tristan e Isolde.

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  33. 1. Queremos um porto seguro ou uma aventura?
    Segundo Calligaris a nossa cultura promove o núcleo familiar. Isso já é motivo suficiente para condiciionar todas as nossas acções. Mesmo que queirámos ser Indiana Jones ou Laras Crofts, a comunidade não nos permite, pelo contrário, acusa-nos.
    Cada um saberá na busca pela sua felicidade o que prefere: a aventura ou o porto seguro. E nesta medida a vida pode-nos pregar muitas partidas. Por isso vou fazer minhas as palavras de Calligaris: "se os esforços para manter ou reinventar o casamento nos parecessem tão emocionantes quanto a procura e o risco da novidade, o casamento encontraria um fôlego extraordinário, pois conciliaria a paixão pelo novo com a nostalgia de um porto seguro." Mas é utopia querer ter o melhor dos dois mundos, e por isso a necessidade cada vez maior de conselheiros matrimoniais.

    2. Desta primeira questão sigo para esta: a paixão deve ser dominada?
    Segundo Leibniz "a paixão é mais do que uma tendência, porque essas são passageiras e às vezes efémeras. Já a paixão mesmo que acabe, enquanto dura, ela consome, dilacera e muitas vezes destroi." Não foi assim que viveu Vinicius? erá sido ele feliz? Não sabemos.
    Para Aristóteles, paixão e´tudo o que faz varir os juízos e de que se seguem sofrimento e prazer." Estamos a falar de movimentos de alma como nos diz o autor destes textos e como tal não podmeos negá-los. Eis aqui a contradição: sigo a minha paixão ou a minha razão? Quem é mais corajoso: o soldado corajoso que arrisca a sua vida ou o virtuoso que segue a razão e age em harmonia com suas paoxões porque as domina? Mas podemos dominar as paixões? Para complicar tudo isso, a cultura ocidental com o seu cristianismo bacoco vem introduzir os conceitos de "queda e infrno". Neste aspecto a virtude é a luta contra a natureza humana, contra as paixões humanas.
    A esse respeito Lebrum diz que devemos viver em conformidade com o logos, mas sem esquecer que as paixões continuam sendo a matéria de nossa conduta. Somos seres passionais, pelo que paixão e razão devem andar de mãos dadas. Será possível?
    A história reza que nada de grande foi feito sem paoxão. A paixão é o que dá estilo a uma personalidade, faz parte da nagtureza humana. então perguntámos: paixão é cegueira, desvario, irracionalidade? penso que é tudo isso e muito mais, pois, ainda segundo o txto de Lebrum, os maiores atos realizam-se num excesso de paixão e amor.
    Por isso à pergunta: as paixões devem ser domadas? eu respondo não. paixão é o sal da nossa vida semsaborona. paixão é dar costas á razão e deixar falar o coração. paixão é querer com muita força e saber viver sem ser por ela dominado. Aqui está o grande desafio. Nessa medida muitos casamentos falham porque a monotonia do dia-à-dia não se compadece com a aventura, com a novidade e com as paixões individuais.

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  34. 3. Na sequência dos meus dois primeiros posts a minha terceira pergunta é: não teremos nós medo da paixão?
    Esta pergunta remete-nos para a leitura de marilena Chaui que diz que temos medo do grito e do silêncio, do vazio e do infinito, do efémero e do definitivo, do para sempre e do nunca mais. (este do para sempre faz-me lembrar “até que a morte nos separe”. Que grande mentira!). Na verdade temos mesmo é medo da morte. E como se isto não bastasse, a igreja, também faz-nos ter medo da culpa e do castigo. O medo rouba-nos a coragem. Assim sendo temos medo de viver as nossas paixões, temos medo de ser mulher porque desde sempre tem-se medo do feminino e por isso a mulher tem sido retratada ao longo da história como a feiticeira, a traiçoeira, a pecadora. Nesta medida pergunto: serão as paixões diferentes entre homens e mulheres?
    Em “Peixe Grande e a paixão pela vida” o desafio é não ter medo de viver e muito menos de projectar nos filhos aquilo que os pais não foram capazes de viver. Calligaris diz que o gosto pela vida é uma paixão que nos é transmitida de maneiras diferentes, segundo a cultura, a época e a família em que nascemos. Nesta medida, se tivermos medo não saberemos viver. Como diz Descartes: “medo é o contrário da ousadia, um frio na alma que paralisa o corpo.” O pai da personagem de peixe grande foi buscar a coragem – virtude oposta ao medo – nas hsitórias que escrevia sobre o seu quotidiano. Não deixa de ser uma forma de paixão ou de viver a paixão. Ele romanceou a sua vida através da escrita. “Vivendo a vida como uma aventura maravilhosa”, deveria ser a máxima de todo o ser humano. Mas a aventura é vista como pecado pelo cristianismo que nos castra e que nos incutiu conceito de pecado.
    Ao contrário do que possam concluir das minhas observações, eu sou católica praticante, mas não concordo com muitas das tomadas de posição da Igreja enquanto instituição. Acredito neste ser superior que falou de amor (amor que é também paixão) e que nos convidou a viver a vida na plenitude. Tudo o resto tem sido modificado no sentido de assegurar interesses de elites e poderosos. Como nos diz Chaui “a cultura da culpa desloca o diabo de fora para dentro da consciência, a cultura do medo, alicerçada sobre o horror da plebe, opera igual deslocamento.” O novo inimigo do heroi da cristandade é o povo e para tal houve a necessidade de criar um Princípe que ficaria responsável pela plebe. Penso que o Papa representa esta figura do princípe manipulador e opressor. Nesse sentido eu recuso-me fazer parte desta instituição.

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  35. 3. Na sequência dos meus dois primeiros posts a minha terceira pergunta é: não teremos nós medo da paixão?
    Esta pergunta remete-nos para a leitura de marilena Chaui que diz que temos medo do grito e do silêncio, do vazio e do infinito, do efémero e do definitivo, do para sempre e do nunca mais. (este do para sempre faz-me lembrar “até que a morte nos separe”. Que grande mentira!). Na verdade temos mesmo é medo da morte. E como se isto não bastasse, a igreja, também faz-nos ter medo da culpa e do castigo. O medo rouba-nos a coragem. Assim sendo temos medo de viver as nossas paixões, temos medo de ser mulher porque desde sempre tem-se medo do feminino e por isso a mulher tem sido retratada ao longo da história como a feiticeira, a traiçoeira, a pecadora. Nesta medida pergunto: serão as paixões diferentes entre homens e mulheres?
    Em “Peixe Grande e a paixão pela vida” o desafio é não ter medo de viver e muito menos de projectar nos filhos aquilo que os pais não foram capazes de viver. Calligaris diz que o gosto pela vida é uma paixão que nos é transmitida de maneiras diferentes, segundo a cultura, a época e a família em que nascemos. Nesta medida, se tivermos medo não saberemos viver. Como diz Descartes: “medo é o contrário da ousadia, um frio na alma que paralisa o corpo.” O pai da personagem de peixe grande foi buscar a coragem – virtude oposta ao medo – nas hsitórias que escrevia sobre o seu quotidiano. Não deixa de ser uma forma de paixão ou de viver a paixão. Ele romanceou a sua vida através da escrita. “Vivendo a vida como uma aventura maravilhosa”, deveria ser a máxima de todo o ser humano. Mas a aventura é vista como pecado pelo cristianismo que nos castra e que nos incutiu conceito de pecado.
    Ao contrário do que possam concluir das minhas observações, eu sou católica praticante, mas não concordo com muitas das tomadas de posição da Igreja enquanto instituição. Acredito neste ser superior que falou de amor (amor que é também paixão) e que nos convidou a viver a vida na plenitude. Tudo o resto tem sido modificado no sentido de assegurar interesses de elites e poderosos. Como nos diz Chaui “a cultura da culpa desloca o diabo de fora para dentro da consciência, a cultura do medo, alicerçada sobre o horror da plebe, opera igual deslocamento.” O novo inimigo do heroi da cristandade é o povo e para tal houve a necessidade de criar um Princípe que ficaria responsável pela plebe. Penso que o Papa representa esta figura do princípe manipulador e opressor. Nesse sentido eu recuso-me fazer parte desta instituição.

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  36. 1. Na última linha do último blog, Calligaris escreveu que “agora, para amar, como para viajar, é preciso ter determinação e coragem”. Vinicius experimentou esse tipo de relação com cada uma das suas mulheres?

    Penso-me que o acabamento das relações entre ele e as suas mulheres não foi por causa de uma falta de determinação nem coragem, mas porque, simplesmente, do fogo da paixão apagou. Como ele sempre ficou apaixonado com seu trabalho só para deixa fora quando acaba parece que refletir o que aconteceu nas suas relações. No seu trabalho e suas relações, cada um deles começou com um fogo que queimou intensamente. É inevitável que o fogo enfraqueça e eventualmente apague. Talvez ele tivesse determinação e coragem não para as suas relações mas para seguir essa paixão até qualquer lugar, seja um poema ou uma mulher.

    2. No blog chamado “A paixão pelo novo e o casamento,” Calligaris disse que muitas vezes a paixão numa relação acaba quando chega na tortura de mesmice que nós, como seres humanos, odiamos tanto. Isto aconteceu com as relações entre Vinícius e as suas mulheres ou foi outra coisa que levou as relações ao fim?

    Como VM descreve no documentário, o amor simplesmente acaba. Ele não entende por que as mulheres ficaram com tanto raiva no fim porque é natural que isto acontece. Parece que VM pertencia num “throw-away culture” como nós temos aqui nos Estados Unidos especificamente no tratamento dos casamentos. Calligaris disse que a melhor descrição do que os casais pensam quando há problemas no casamento é, “Não funciona mais? Jogue fora” e por isso tantos casamentos acabam em divórcio. Eu acredito que VM tinha essa mentalidade, que uma relação não precisa de trabalho nem paciência, os problemas e o apagamento do fogo simplesmente significaram que chegou na hora para passar a próxima.

    3. Segundo o blog, “’Peixe Grande’ e a paixão pela vida”, argumenta Calligaris que é possível herdar a vontade de viver a vida apaixonadamente?

    Como disse Calligaris, “o gosto pela vida não vem com o pacote genético: é uma paixão que nos é transmitida de maneiras diferentes, segundo a cultura, a época e a família em que nascemos.” Se a paixão pode ser transmitida pela família na qual nascemos, talvez possamos herdar essa paixão não geneticamente, mas sim através do exemplo. O pai de Calligaris incutiu a noção de paixão nele por fazer a mesma coisa que o pai em “Peixe Grande” fez: os dois romancearam a vida. “Peixe Grande” mostra que, como segundo Calligaris, que “para amar a vida, é preciso saber romanceá-la, não necessariamente devaneando que cada peixe pescado seja Moby Dick, mas vivendo a vida como uma aventura maravilhosa.” Embora que Calligaris não entendesse quando era criança que esse método era o motivo do seu pai quando era criança, ele eventualmente foi capaz de percebê-lo e vivir numa maneira para honrar seu pai. Também, agora que ele é um pai de três meninos, ele “gostaria de lhes transmitir uma paixão pela vida que não dependesse da realização de sonho algum, ainda menos de um sonho meu.” Ele explica mais ainda, “gostaria que eles encontrassem sua razão de viver não alhures.” Será que essa mentalidade existiria se seu pai não tivesse vivido nessa maneira? Por causa do pai, parece que a idéia de encontrar paixão na vida agora está passando por gerações, cada geração herda a mesma noção. Talvez seja possível herdar essa mentalidade e passá-la aos outros.

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  37. 4. Ao descrever a personagem de Cristina do filme “Vicky Cristina Barcelona”, o narrador disse que, “Ela não sabia o que queria, mas sabia o que não queria”. Ao deixar suas mulheres depois da paixão se foi embora e gastar todo seu dinheiro, Vinícius estava vivendo sua vida com paixão na mesma maneira, sabendo que ele não quer?

    Eu acho que sim. Talvez ele não quisesse ficar numa relação que já não tinha a sensação do amor, como muitos de nós fazemos todos os dias. Em vez de perceber ele como um covarde, talvez ele fosse destemido para poder acabar com uma relação que não queria mais, em vez de ficar infeliz por causa da outra pessoa. Ao mesmo tempo, é difícil determinar se ele fosse realmente feliz em fazer isto, ou seja, o ato dele sempre deixar uma relação para começar uma outra. A quantidade que ele bebeu poderia ser a primeira indicação de que ele não fosse feliz mesmo. Parece que com nove esposas, VM não sabia o que queria mas talvez ao mesmo tempo também não soubesse o que não queria e que vivesse a sua vida seguindo suas várias paixões quase cegamente. É difícil concluir quando o homem em questão é um mistério em si mesmo.


    5. Nos blogs, Calligaris introduz interpretações do amor de muitos lados diferentes. Duas interpretações que parecem opostas extremas são entre Badiou e Kipnis. No lado de Badiou, o amor é uma construção que requer tempo e trabalho para mantê-lo. No outro lado de Kipnis sugere que talvez seja melhor para o funcionamento do amor se os parceiros não realmente não se conhecem. Qual é a interpretação mais razoável?

    Claro que a primeira interpretação é mais razoável, mas por quê? Porque é que a sociedade nos conta? Ou porque é realmente a verdade? Penso que a primeira interpretação é mais razoável porque, sim, é o que a sociedade moderna incutiu em nós mas também porque (e isto é o que a sociedade não nos diz) não há um parceiro perfeito, “the one;” realmente não existe. O amor que dura acontece quando duas pessoas trabalham juntos na relação e constroem o amor através da paciência e da vontade de querer que a relação sobreviva. Não acredito que “the one” exista, apenas “the one” com quem a pessoa acha que vale a pena fazer sacrifícios. Claro que precisa de amor na fundação dessa relação mas não acho que esse amor aparece de nada, é construída e desenvolvida com o tempo. E para Kipnis, sim, é divertida descobrir o mistério de alguém que não conhece mas, eventualmente, pode aborrecer. O amor que dura, e peça desculpa se eu esteja sendo uma idealista, é quando uma pessoa encontrar alguém e depois de aprender todos os imperfeitos do outro, ainda acha que vale a pena ficar com e amar essa pessoa. No caso do Vinícius, talvez na sua vida toda, ele nunca encontrasse esse sentido.

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  38. A propósito da crónica sobre Vicky Cristina Barcelona podemos dizer que Vinicius de Moraes teve várias mulheres para fugir à relação menos interessante?
    Conforme vimos na biografia de Castello, Vinicius amou cada uma das suas mulheres como da última se tratase. Nessa medida podemos fazer um paralelo com esta crónica de Calligaris.
    Quando é que o amor-paixão que une dois jovens se transforma em mais uma peça da mobilia do quarto? Quando é que as brincadeiras e os assaltos amorosos dão lugar à posse do comando de televisão? Seriam esses sinais que faziam com que vinicius terminasse os seus relacinamentos? E nas nossas relações, também não acontecerá o mesmo? Não será que o medo retira-nos a capacidade de lutar pelo que queremos mesmo que muitas vezes não saibamos o que seja, apenas queremos sair dali.
    Não tenho nada contra os "porto-seguros" até porque eles significam estabilidade, comodidade e segurança. Mas eles també podem fazer-te chegar ao fim da vida com um gosto amargo de boca: passei pela vida sem viver! Por isso e tal como diz o autor desta crónica, quem não tem coragem de viver novas paixões passa o tempo protegendo-se delas. Mas novamente podemos contrapôr dizendo que nem todos querem para suas vidas esse amor paixão que dilacera corações e faz viver no fio da navalha. Há quem prefira a tranquilidade da relação de um amor sereno feito de planeamento, monotonia, rotina. Esse amor interessa a muita gente porque têm medo do outro tipo de amor. Nem todos querem ser uma Cristina (querem ou podem).
    Viniciu viveu nove paixões. Sofreu e fez sofrer. Quem poderá dizer que ele estava certo ou errado? quem poderá julgá-lo? Ele "esbarrava" nas paixões e "encarava-as". Grande Vinicius. E isso é que o torna no poeta da paixão. Quem não vive assim intensamente o amor e a paixão não poderá nunca ecrevê-la e descrevê-la.
    Saber o que não se quer já é um bom passo para começar uma jornada porque a vida não é uma gaveta com os compartimentos todos arrumados. A vida é um jogo de xadrez onde temos de lidar com vários personagens até ao momento em que nos podem fazer cheque-mate. Mas "Who cares?", já que é para morrer então que seja em grande e com muita paixão para recordar. Eu não quero ser um "velho do Restelo" que pasa pela vida apenas criticando e julgando a coragem dos outros, dos que vêm mais longe.

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  39. (Este é o segundo dos três segmentos que tentei postar ontem, mas que por qualquer equívoco não chegou a ser enviado)

    Lebrum ao falar de virtude como sendo“… simples questão de bom gosto e de equilíbrio das paixões em função das circunstâncias”, oferece-nos certas teorias que, ao fim e ao cabo, se resumem a um paradoxo que, por seu turno, nos transportam ao ponto de partida. Por um lado, diz-nos que o virtuoso será aquele que consegue dominar as suas paixões. Por outro, Segundo Nietzsche: “Enquanto eu precisar esforçar-me para resistir ao que as minhas paixões trazem de excessivo, ainda não as domei. Ainda não sou virtuoso, ou seja, forte”. (16).
    Concordo com Aristóteles e Hegel ao defenderem que “Paixão e razão são inseparáveis, assim como a matéria é inseparável da obra e o mármore da estátua”. Afinal de contas, é do nosso conhecimento que, “Nada de grande se fez sem paixão” (Hegel, 18).

    Nos textos de Calligaris presenciamos uma série de relatos, quer se tratem de filmes, ou de meros trechos, que compreendem algo em comum—paixão, suas causas e seus efeitos. Por exemplo, no filme Vicky and Cristina Barcelona (que por sinal tive a ocasião de ver), estamos perante diferentes paixões amorosas, algumas das quais vividas intensamente. Por um lado, Vicky, faz o papel de uma personagem que pensa saber o que quer, nunca lhe passando pela cabeça sucumbir a uma paixão por outrém (além do seu noivo) e muito menos por alguém, tipo “D. Juan”. No entanto, ao longo do filme, após várias tentativas de suprimir esse desejo, que é novo, Vicky acaba por se entregar a algo que se apresenta demasiado forte, mais forte do que a sua própria vontade. Calligaris levanta a questão, “Pode ser que Vicky seja desesperadamente normal, trocando a chance de amar por uma casa num subúrbio norte-americano (estou sendo injusto com Vicky: na verdade ela tenta...)”. Por outro lado, existem outras personagens, nomeadamente Penélope Cruz, que mantém uma relação com o seu ex-marido (o tal “D.Juan” – não me recordo exactamente o seu nome), relação essa que nos parece de paixão-ódio-loucura. “ Os casais que se amam de paixão, cujos parceiros parecem ser feitos um para o outro, em regra, acabam tentando se matar -com faca, revólver ou qualquer outro instrumento”. É complicado!!
    Ambos são artistas de pintura e, como tal, exibem uma sensibilidade e uma criatividade um tanto ao quanto mais excepcional do que a pessoa comum (estão a pensar no mesmo do que eu? Claro, como o Vinicius). Então a certa altura estamos perante um triângulo amoroso entre Vicky, Penélope e “D. Juan”. A amiga do Calligaris tinha razão: “O amor e a paixão não nos fazem necessariamente felizes, mas são uma festa e uma alegria porque deles podemos esperar ao menos isto: que eles nos tornem um pouco outros, que eles nos mudem. Agora, nem sempre funciona...

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  40. Aqui eu sigo a referencia a Pessanha de Greg:

    O comportamento apaixonado extremamente passivo é um perigo que tem que ser regulado. Uma maneira de tratar esta doença é através da arte. A arte do poeta Vinícius era uma arma para atacar as injustiças do mundo, como ele escreveu numa crítica de filme em 1950: “[T]he most powerful and precise of weapons—poetry” (“The Making of a Document”). Com esta munição, Vinícius conseguiu soltar a paixão poderosa de um jeito preciso—um fogo intenso que acerta em cheio o alvo. Assim o incêndio fervendo na mente não consome o templo do artista (pelo menos não antes de ter 67 anos bem vividos neste caso). Esta utilização da palavra para comunicar a mais profunda emoção é traçada pelo filósofo José Pessanha: “em Platão, amor e fala, amor e discurso, amor e palavra estão intrínseca e definitivamente interligados. Há, para Platão, cumplicidade entre Logos e Eros” (77). Sem paixão, as palavras soam vazias. Sem palavras, a paixão pode consumir por dentro—e deixar uma casca vazia de um ser humano.

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  41. Aqui eu sigo as referencias a Chauí:

    A filósofa Marilena Chauí se pronuncia sobre como sujeitos respondem quando pergunta de que eles têm medo:

    Da morte, sempre foi a resposta. E de todos os males que possam simbolizá-la, antecipá-la, recordá-la aos mortais. Da morte violenta, completaria Hobbes. De todos os entes reais ou imaginários que sabemos ou cremos dotados de poder de vida e de extermínio: da natureza desordenada, da cólera de Deus, da manha do Diabo, da crueldade do tirano... da peste, da fome e do fogo, da guerra e do fim do mundo... Da repressão, murmuram os pequenos; da subversão, trovejam os grandes. (36)

    O estímulo mais óbvio é a morte, que mais desperta a paixão política. Quando um protesto pacífico sofre um ataque e um manifestante é morto, os protestos crescem—mais pessoas simpatizam. Quando alguém na multidão mata um policial, é o estado que ganha votos de simpatia. A realização de que qualquer um podia ter sido o morto cria uma resposta instintiva para limitar a possibilidade de mais morte.

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